No universo que é o Vale do Catimbau, onde ventos e pedras moldam a imaginação, de repente, a branca e espinhosa caatinga se confunde com aves, lagartos, cobras, cabeças e pessoas de madeira, que se espalham pelo chão quente e avermelhado, em volta uma casa simples, de taipa. Paredes, animais e arte, tudo feito à mão. É o mundo de José Bezerra, escultor.
Sertanejo, de pele dourada, cabelos grisalhos e chapéu de couro, José Bezerra recebe a todos ali, no seu próprio mundo. Entre as peças que repousam no chão seco, ele conta que tudo aquilo começou em um sonho. Sonhou com uma escultura e algo lhe dizendo que “seria um grande artista”. Pronto, acordou e partiu pela vegetação em busca do pedaço de madeira que viu enquanto dormia. Fez a escultura e foi apenas a primeira.
O artista tem a preocupação de trabalhar com galhos caídos, não corta a madeira da caatinga para fazer suas peças. “Eu olho a madeira no chão, vejo um pássaro, vou lá e talho o pássaro”, conta. Bezerra afirma que precisa comprar madeira em Petrolina para esculpir a maior parte de suas peças.
Lá no ateliê, de paredes de taipa, teto de palha e chão de lascas de madeira, o Zé Bezerra conta um pouco de sua história, além de causos e nos mostra outro talento: a música. Com um berimbau de madeira, chaleiras e arame, ele canta as próprias músicas, de improviso. “Eu vou juntando as letras, acrescentando uma coisa aqui, outra ali, e nunca uma música sai igual à outra”.
O toque rápido e preciso no instrumento monocórdico nos remete às nossas origens árabes – que explora os diversos tons, semitons e tudo o que mais tiver entre cada um deles. É um som puro, longe das convenções e padrões teóricos da música ocidental, é bruto, e, por isso, belo.O timbre e a afinação do artista impressionam, e é quase impossível não querer fazer um som junto com ele e fazer parte daquele mundo (agora sonoro) por alguns minutos.
Tentei tocar o berimbau e ele logo pediu licença para ir em casa. Voltou com uma zabumba e disse: “vamos lá?”.
Ditou o pulso, o ritmo, e cantou o Sertão.